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Estudo prevê detecção de polímeros em vítimas de abuso sexual para identificar agressor

O Brasil registra, em média, 822 mil casos de estupros por ano, o equivalente a dois por minuto. O dado, retirado de uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Brasileira (IPEA), mostra uma triste realidade do país. Ainda de acordo com a pesquisa, apenas 8,5% dos casos são reportados para a polícia, aumentando as subnotificações, e somente 4,2% vão parar em estatísticas voltadas para a saúde, um desafio para autoridades e para sistemas de saúde em todo mundo ao identificar casos de violência e seus respectivos agressores.

Mas um estudo desenvolvido pela doutora italiana Marta Da Pian pode mudar esse cenário. Com o tema “Detecting polymer traces after sexual abuses” (Detectando traços de polímeros após abusos sexuais), a pesquisadora participou de uma conferência com estudantes e professores, na quarta-feira (31), durante a 46ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Química (RASBQ), em Águas de Lindoia (SP).

Análises de DNA têm sido amplamente utilizadas na área forense a fim de contribuir para a identificação do autor de um crime, e a investigação em casos de abuso sexual se concentra, em geral, na localização e identificação de fluidos biológicos, seguida da análise de DNA. “Mas hoje os abusadores estão mais espertos, pois eles sabem que podem ser identificados. Para não deixar rastros, muitos usam a camisinha”, analisou Da Pian.

De acordo com o estudo desenvolvido pela professora, a identificação de certos compostos presentes em preservativos pode ser útil para reconstituir o evento ocorrido, principalmente em casos de agressões sexuais onde a análise de DNA não é capaz de identificar o agressor.

Da Pian apresentou um estudo com base na espectroscopia de infravermelho (IV) e ressonância magnética nuclear (RMN) para analisar e correlacionar os polímeros presentes em diversas marcas de camisinhas com resíduos orgânicos deixados nos órgãos reprodutores, tanto masculino quanto feminino, após o uso dos preservativos. Segundo ela, a identificação de resíduos de compostos de oriundos de preservativo em swabs vaginais (exames realizados com cotonetes) pode se tornar uma importante evidência a ser adicionada aos dados circunstanciais disponíveis e a outras evidências coletadas, especialmente nos casos em que faltam informações precisas sobre a dinâmica do evento.

A pesquisa teve como objetivo identificar os sinais característicos das moléculas presentes em diversas marcas de camisinha, através das técnicas de infravermelho e RMN, e criar uma espécie de “biblioteca” com essas informações. Posteriormente, por meio do swab realizado diretamente nos órgãos sexuais masculinos e femininos, analisaram os resíduos deixados pela camisinha após o ato sexual. Ao comparar os resultados da biblioteca com os dos swabs, os pesquisadores conseguiram identificar qual foi a marca da camisinha utilizada.


Primeiro passo
A corte judiciária da Itália já utilizou a metodologia como apoio para identificar um suspeito de violência sexual. O caso foi de uma mulher de 35 anos, violentada por um desconhecido, cujo exame de DNA não foi capaz de identificar nenhum perfil genético, por conta do uso da camisinha. Contudo, a vítima foi capaz de identificar o agressor e os investigadores encontraram uma caixa de camisinhas em sua casa. Após análises, a composição polimérica dessa marca foi confrontada com resquícios de polímero encontrados no fluido vaginal da vítima e o resultado foi um “match” nessas análises, o que confirmou a ação do agressor.

“A corte precisa saber que existe essa possibilidade. O lubrificante da camisinha pode ser persistente no corpo humano, mesmo com o banho, e isso é uma evidência. Ele pode durar até 25 horas na vagina e 20 horas no pênis”, alertou.

Apesar de ser uma vitória, Marta Da Pian lamentou que não haja literatura nesse sentido para incrementar a pesquisa. “Nosso trabalho está em progresso, mas é preciso investir em bases de dados e em estudos. Fico feliz de contribuir para isso, mas precisamos avançar mais”, afirmou.

Com o estudo, a professora espera que mais casos sejam solucionados e que mais vítimas tenham coragem de denunciar. “Esses números não refletem a realidade, porque temos muitos casos subnotificados. E não é um problema só do Brasil, é um problema global. Na Itália, meu país de origem, dados coletados até 2014 mostram que 31,5% de mulheres entre 16 e 70 anos já tinham vivenciado algum tipo de violência. E 40% relataram ter sofrido abuso de parentes ou amigos. Se não podemos confiar nessas pessoas, em quem vamos confiar?”, lamentou.

SBQ
O tema da 46ª Reunião Anual da SBQ, “Química: Ligando ciências e neutralizando desigualdades”, propõe aos participantes várias reflexões sobre as desigualdades observadas, em diferentes níveis, de como as ciências e principalmente a Química podem contribuir para a sua mitigação. A escolha do tema foi pensada na celebração dos 100 anos das principais teorias ácido-base.

Fonte: https://cfq.org.br/noticia/estudo-preve-deteccao-de-polimeros-em-vitimas-de-abuso-sexual-para-identificar-agressor/

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