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Por que livros da Era Vitoriana podem ser tóxicos para quem manuseia

Cores usadas nas obras vêm de pigmentos feitos a partir de metais pesados. Esses materiais contém toxinas que podem prejudicar saúde em caso de contato direto; entenda

Leila Ais, aluna da Universidade Lipscomb (EUA) que participou do projeto, corta uma amostra da capa de um livro para testar presença de corantes tóxicos — Foto: Divulgação/Kristy Jones




Com encadernação de capa dura, tecidos e cores chamativas, os livros da Era Vitoriana (1837-1901) impressionam por sua opulência. Isso gera também curiosidade em manusear essas obras, para além da leitura de seu conteúdo. Contudo, um novo estudo sugere que essas mesmas características podem representar riscos à saúde, uma vez que existe risco de exposição elevada a compostos tóxicos.

Embora já se soubesse que as capas de alguns livros contavam com pigmentos de metais pesados, como chumbo, cromo e arsênico, o impacto do contato a esses materiais ainda não havia sido mensurado. Isso até pesquisadores da Universidade Lipscomb, nos EUA, identificarem níveis prejudiciais de radiação em alguns volumes do acervo de sua biblioteca principal.

“É muito importante que os bibliotecários estejam cientes desses riscos, uma vez que eles podem ser contaminados por essas substâncias, caso esfreguem os pigmentos das capas em suas mãos ou inalem o material tóxico”, explicam em nota os pesquisadores responsáveis pelo projeto. As descobertas foram apresentadas neste final de semana em uma reunião da Sociedade Americana de Química (ACS).


Desenvolvimento do projeto


Toda a investigação começou quando a equipe de bibliotecários de Lipscomb procurou o departamento de Química da universidade para verificar a presença de compostos químicos nas capas de seu acervo. Tal exercício foi proposto pelo “Projeto Livro Venenoso” (Poison Book Project).

Iniciado em 2022 na Biblioteca de Winterthur, o projeto trabalha com uma equipe multidisciplinar para analisar livros da Era Vitoriana. Seu objetivo é divulgar essa possível fonte de contaminação e evitar novos quadros de contágio.


No acervo de Lipscomb, a análise foi feita a partir da aplicação de três técnicas diferentes:


  • Fluorescência de raios X (XRF): verificou qualitativamente se arsênio ou outros metais pesados estavam presentes em alguma das capas dos livros;
  • Espectroscopia de emissão óptica com plasma indutivamente acoplado (ICP-OES): determinou a concentração desses metais no material; e
  • Difração de raios X (XRD): identificou as moléculas de pigmento que contêm esses metais.


Embora a XRD tenha sido usado anteriormente para examinar pinturas e papéis de parede, esta é a primeira vez que a técnica foi usada para verificar veneno em livros. Esses dados obtidos via XRD foram, justamente, os responsáveis por indicar que chumbo e cromo estavam presentes em alguns da universidade.


Para calcular as quantidades, eles cortaram amostras aproximadamente do tamanho de um pequeno clipe de papel das capas de tecido e as dissolveram em ácido nítrico. A análise por ICP-OES mostrou que tanto o chumbo quanto o cromo estavam presentes em níveis muito elevados.

A concentração de chumbo, porém, era bem maior do que de cromo, o que foi considerado curioso pelos especialistas, já que o cromato de chumbo (II) contém quantidades iguais de chumbo e cromo. Por isso, eles especulam que os corantes usados para colorir os livros contêm outros pigmentos à base de chumbo que não têm cromo, como óxido de chumbo (II) ou sulfeto de chumbo (II).



Riscos no manuseio


Com os dados em mãos, os pesquisadores descobriram que as concentrações de metais pesados estavam acima dos limites aceitáveis para exposição crônica. Isso, de acordo com os padrões definidos pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDCs) dos EUA. Na amostra dissolvida, por exemplo, a concentração de chumbo era o dobro do limite permitido e de cromo quase seis vezes maior.


A exposição ao chumbo ou cromo inalados pode levar a diversos efeitos prejudiciais à saúde. Câncer, danos pulmonares ou problemas de fertilidade são alguns exemplos de doenças do tipo.

O estudo fez com a biblioteca de Lipscomb selasse seus livros coloridos do século 19 que ainda não foram testados em sacos plásticos, com fecho zip para manuseio e armazenamento. Enquanto isso, livros confirmados como contendo corantes perigosos também foram selados em sacos e removidos da circulação pública. Mais pesquisas serão necessárias para verificar qual a melhor forma de conviver com esses livros, sem que esses ameacem a integridade física de quem os manuseia.



PorArthur Almeida

Fonte: https://revistagalileu.globo.com/ciencia/arqueologia/noticia/2024/08/por-que-livros-da-era-vitoriana-podem-ser-toxicos-para-quem-manuseia.ghtml

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