DISCURSO DO PRESIDENTE JOSÉ DE RIBAMAR – AUDIÊNCIA PÚBLICA DO MARCO LEGAL DO SANEAMENTO – CONGRESSO NACIONAL
Bom dia aos parlamentares aqui presentes, aos colegas debatedores, a todos aqueles que acompanham essa audiência pública – às senhoras e senhores.
É um privilégio muito grande estar aqui, no Palácio do Congresso Nacional, representando o Conselho Federal de Química.
Temos a percepção de que a Ciência, e em especial a Química, tem muito a contribuir para os debates deste parlamento. E é com especial satisfação que recebemos o presente convite, em referência a uma data tão importante.
Os dois anos do novo Marco Legal do Saneamento oferecem uma resposta à população brasileira, um alento a uma das nossas maiores chagas sociais: a incapacidade que este país apresenta de suprir nosso povo de um acesso universal à água potável e ao saneamento básico.
Antes de qualquer coisa, é preciso registrar a qualidade técnica do Marco Legal do Saneamento.
Resultado de um longo período de debates, de reflexão e de construção de consensos, a nossa legislação é um exemplo positivo da capacidade do Congresso Nacional de oferecer soluções para o país.
Deixo consignado aqui os nossos elogios aos parlamentares envolvidos nessa pauta.
De nossa parte, entendemos que o melhor do Marco Legal do Saneamento ainda está por vir. Há a perspectiva de que a nova lei destrave os investimentos públicos e, em especial, os investimentos privados no setor. Projetos dessa monta levam tempo para a elaboração, planejamento e execução, mas acreditamos que a nova legislação oferece o ambiente necessário para que uma nova era tenha início no que diz respeito a esses serviços.
Como explicita o próprio Marco Legal do Saneamento, não temos tempo a perder. O próprio texto traz metas estritas e ousadas:
Até 2033, deveremos prover água potável a noventa e nove por cento da população. Além disso, outra meta é coletar e tratar o esgoto de noventa por cento dos brasileiros.
O relatório de Avaliação Anual do Plano Nacional de Saneamento Básico 2020 nos aponta para uma realidade inquietante.
No conjunto global, 14 dos 30 indicadores analisados apontam que a realidade observada se afasta do Cenário “Busca da Universalização”, que é o cenário de referência, e se desloca para o Cenário “Distante da Universalização.
Tal situação sinaliza para a necessidade de mudanças no cenário de referência na próxima revisão do Plano, com consequente ajuste das estratégias para se atingir as metas estabelecidas.
Para termos a dimensão do desafio, atualmente trinta e cinco milhões de pessoas vivem sem água tratada no país. a rede de coleta e tratamento de esgotos é ainda mais débil – quase metade da população não dispõe dos serviços.
A considerar o ritmo atual de investimentos, teremos dificuldade em chegar lá. em 2020 foram menos de quatorze bilhões de reais alocados, exatamente a realidade que o novo marco legal do saneamento se propõe a transformar.
É importante destacar ainda o cenário adverso que se desenha a partir dos eventos climáticos mais severos que se observam nos últimos anos. O conceito de “segurança hídrica” precisa estar cristalizado entre os agentes públicos, para que o Brasil evite uma catástrofe e que condene milhares de pessoas a migrarem de um local a outro em busca de água.
De parte do Conselho Federal de Química, contudo, chamamos a atenção para outro aspecto, não menos desafiador: a necessidade de profissionais com conhecimento técnico e científico para operar essa transformação.
E o único profissional qualificado para tal é o profissional da química.
O saneamento básico compreende quatro pilares e três deles estão intimamente relacionados com o exercício da profissão de química.
Vejamos.
Quanto ao abastecimento de água potável…
O tratamento da água para consumo humano envolve vários processos como a Coagulação e Floculação / a Sedimentação / a Decantação / a Filtração / a Desinfecção / e a Fluoretação.
Nesses processos, produtos químicos são adicionados; as reações químicas precisam ser dirigidas e controladas; e os parâmetros devem ser constantemente analisados para que haja um controle e avaliação da qualidade da água a ser distribuída à população, em conformidade com a Portaria n. 888/2021, do Ministério da Saúde.
Para isso, são fundamentais as análises químicas e físico-químicas para determinação, por exemplo, do pH / da turbidez / da cor / e do cloro residual livre. Além de Análises Microbiológicas para quantificação de E. coli e coliformes totais.
No caso do esgotamento sanitário…
Podemos resumir o tratamento em quatro etapas:
O Tratamento Preliminar, que tem como principal função a remoção de resíduos sólidos grosseiros e areia para que esses materiais não causem danos às bombas, válvulas e outros equipamentos, além de evitar obstruções no sistema.
– O Tratamento Primário, destinado à remoção de sólidos em suspensão sedimentáveis e parte da matéria orgânica. O qual é formado principalmente pelos decantadores primários ou processos físico-químicos como floculação, decantação e flotação.
– No Tratamento Secundário predominam os mecanismos biológicos. Essa etapa tem como principal função a remoção de matéria orgânica carbonácea dissolvida, que não foi removida nos processos primários. E aqui vemos as lagoas anaeróbias e aeróbias / as lagoas de estabilização / os reatores biológicos / e os decantadores secundários.
– Por fim, o Tratamento Terciário consiste em processos químicos nos quais a remoção ou conversão de contaminantes ocorre pela adição de produtos químicos ou devido a reações químicas como precipitação, adsorção e oxidação química.
O controle de qualidade no processo de tratamento de esgoto envolve análises para acompanhamento dos Parâmetros Químicos e Físico-Químicos de: Cor / Turbidez / Sólidos Totais / pH / nitrogênio e fósforo / Oxigênio dissolvido / óleos e graxas / DBO e DQO / e matéria orgânica carbonácea.
Ou seja, não há como se ter saneamento básico de qualidade sem os Profissionais da Química.
Não menos importante, é o manejo dos resíduos sólidos…
Os nobres parlamentares têm conhecimento de que o crescimento das cidades brasileiras, associado ao consumo em larga escala de produtos industrializados e descartáveis, tem causado um aumento excessivo na quantidade de resíduos sólidos nas áreas urbanas e rurais.
A coleta e destinação final ambientalmente adequada desses resíduos implicam no manejo correto e seu tratamento deve buscar cada vez mais a reciclagem e recuperação de massa e energia desses resíduos, de modo que apenas os rejeitos sejam conduzidos para disposição final.
Contudo, o Brasil ainda direciona maior parte de seus resíduos sólidos ao solo.
Essa disposição final inadequada é uma das grandes responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa, pelo fato de que a gestão de resíduos baseada no aterramento potencializa a decomposição anaeróbia dos materiais orgânicos presentes e consequentemente, a geração de metano.
O desafio do Brasil para atingir as metas do Plano Nacional do Saneamento Básico depende da Química e dos inúmeros profissionais ligados ao setor.
Esses profissionais são responsáveis pelo planejamento, por projetos, fabricação de equipamentos e instalação de redes e de sistemas para o abastecimento de água; pela coleta, tratamento e destinação adequada dos esgotos e dos resíduos sólidos, cumprindo seu compromisso de promover a Química em benefício do desenvolvimento e da qualidade de vida da população brasileira.
Nesse aspecto, é que se destaca o Sistema CFQ/CRQs, formado pelo Conselho Federal de Química e os 21 Conselhos Regionais de Química, distribuídos nas 27 Unidades da Federação.
Somos responsáveis por garantir à população brasileira que atividades relacionadas aos serviços na área da Química e aos produtos desenvolvidos com a aplicação dos conhecimentos desta ciência sejam realizadas por profissionais devidamente habilitados e legalmente registrados.
Fazemos isso por meio da fiscalização do exercício da profissão de químico, conforme estabelecido em lei.
Temos mais de duzentos mil profissionais da química e mais de quarenta e seis mil empresas registradas. lutamos para assegurar aos brasileiros a qualidade dos serviços e produtos consumidos, uma vez que a existência de artigos de consumo do domínio da química sem a garantia de um técnico qualificado oferece riscos à vida, ao patrimônio e à saúde pública.
No caso do saneamento básico, o Sistema CFQ/CRQs desempenha um fundamental papel na defesa da sociedade, na medida em que realiza a fiscalização das atividades que foram mencionadas, coibindo a execução indevida ou incorreta desses serviços essenciais.
Para ilustrar, podemos pensar em alguns riscos associados à ausência dos Profissionais da Química devidamente habilitados e registrados nos CRQs:
Quando as soluções para a coleta e tratamento dos esgotos sanitários não são adequadas, há um favorecimento da proliferação de doenças parasitárias e infecciosas e, também, uma maior degradação dos corpos hídricos. As pesquisas demonstram que deficiências na oferta dos serviços de saneamento básico podem contribuir para a criação de ambientes propícios à proliferação de vetores, como o mosquito Aedes Aegypti, por exemplo.
Além disso, a falta de saneamento básico ou o inadequado controle de qualidade levam a uma maior vulnerabilidade às doenças de transmissão fecal-oral, que se configuram, inclusive, como aquelas que mais causam internações pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Com o tratamento de água correto (realizado pelos profissionais da Química) evita-se o excesso de produtos químicos na água e, desta forma, evitam-se os riscos de intoxicações pelo uso indiscriminado dos mencionados produtos e, consequentemente, é feita a prevenção de doenças causadas por microrganismos patogênicos.
A saúde da população brasileira conta com os Profissionais da Química num trabalho de prevenção aos riscos de doenças, conforme citado, e por isso o papel dos Conselhos Regionais e do Conselho Federal de Química é de fundamental importância.
Nosso dever aqui é destacar esse ponto em particular: de nada adiantará oferecer serviços de saneamento à toda a população sem que o atendimento conte com a segurança que só o profissional da química pode oferecer.
Por isso tudo, é importante reforçar à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), ao Conama, bem como aos órgãos de controle, Tribunal de Contas da União, Tribunais de Contas dos Estados e eventualmente Tribunal de Contas dos Municípios de que observem essa exigência ao fiscalizarem contratos sob o Marco Legal, ou ao estabelecerem editais para licitações ou outras modalidades de contratação dos serviços.
Nestes dois anos do Marco Legal do Saneamento, data digna de comemoração, mas também de reflexão, propomos que as metas ousadas de universalização de bens fundamentais à população, como a água potável, sejam associadas a distinção maior de segurança: a presença de um profissional da Química em todo o processo.
Muito obrigado!
Fonte: https://cfq.org.br/noticia/presidente-do-cfq-marco-legal-oferece-alento-a-uma-das-nossas-maiores-chagas-sociais-a-incapacidade-de-suprir-nosso-povo-de-acesso-universal-a-agua-e-ao-saneamento/
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